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"Existo, logo penso". Friedrich Nietzsche

27 de mai. de 2010

Creio que a mídia precisa de uma resposta, então, resolvi escrever algo.

O DC de 27/05/10 publicou, em uma nota pequena demais, pela importância e gravidade do tema, dados acerca do afastamento de Policiais por conta de tratamentos psicológicos.

A referida nota pode ser encontrada no endereço:

http://www.clicrbs.com.br/diariocatarinense/jsp/default2.jsp?uf=2&local=18&source=a2917349.xml&template=3916.dwt&edition=14770§ion=213

Pois, em função desta nota, resolvi explicitar aos mesmos o porquê do número alto de afastamentos. Segue o texto enviado ao jornal, através de alguns endereços que tenho aqui, do referido jornal, tendo em vista que não possuo o e-mail da redação do referido jornal ou mesmo do colunista Rafael Martini, da coluna visor que foi quem publicou o texto em questão.

Segue o texto.

Oportuna a nota do referido periódico, aliás, oportuna e interessante em função do momento em que vivermos.

Como forma de auxiliar e subsidiar o referido jornal e sua conclusão faz-se necessário algumas avaliações.

A profissão de Policial Militar, por si só já é desgastante, visto que trabalhamos (na maioria das vezes) com um segmento da sociedade, o qual e ignorada e “esquecida’ por esta mesma sociedade, que n/ao raras vezes vê no Policial Militar o solucionador de problemas os quais dizem respeitos a vários órgãos, menos a Policia Militar, resumindo, trabalhados com o seguimento social que todos querem distância e falar que o contato com os mais variados tipos de delinqüentes, que cometeram os mais variados tipos de crimes, não influência no psicológico do ser humano Policial Militar é acreditar em super homem. Isto é facilmente perceptível, ao avaliarmos o número de policiais alcoólatras, o número de separações, divórcios e como mostra a própria conclusão da matéria o número de afastamentos. Porém, este não é o único motivo.

Ora, se a profissão que abraçamos por si só já é stressante, naturalmente que deveria haver por parte das autoridades uma valorização, ou no mínimo uma compreensão, como forma, até de uma compensação pelo stress e pela responsabilidade que temos. Infelizmente não é o que ocorre, senão vejamos:

COMECEMOS PELO FUTURO DO PRAÇA.

Em toda a profissão que o ser humano “abraça”, este vislumbra um futuro, uma carreira, enfim uma condição que lhe permita aliar segurança, reconhecimento e valorização e tais atributos, para os Praças das instituições militares estaduais não são disponibilizados.

Temos, ainda hoje, soldados com 24, 25 anos na mesma graduação, a despeito da inúmeras vagas disponíveis e não disponibilizadas. Naturalmente que tal situação desestimula o profissional que sente o tempo passar e percebe que seu trabalho, esforço e sua dedicação não são reconhecidos pelas autoridades, sejam elas civis ou militares. Pior, este mesmo Praça, vê ao seu lado, outra categoria (Oficiais) onde a carreira flui com relativa tranqüilidade a ponto de em menos de cinco anos alguns serem promovidos duas vezes. Eis o primeiro motivo de desestímulo e a situação, acaso uma atitude não seja tomada, tende a piorar sobremaneira, haja visto que os novos Praças que “abraçarão” a profissão já entrarão como uma mentalidade diferenciada em função de possuiremos curso superior e isto por si só já irá exigir uma nova mentalidade tanto dos gestores das instituições militares, quanto das autoridades civis, sobe pena de em um futuro bem próximo a profissão de servidor da segurança pública, policial militar deixar de existir ou servir apenas como trampolim para profissões mais interessantes do ponto de vista de carreira, de futuro. Ou pensamos de forma séria, institucional e coletiva ou então “morreremos” lentamente.

AGORA A QUESTÃO DAS RELAÇÕES INTERNAS.

A evolução e o desenvolvimento social ocorrido na última metade do século XX em diante é visível e se intensificou sobremaneira a partir das décadas de 80 e 90, em função de vários fatores, que vão deste da revolução tecnológica, fato que possibilitou acesso a inúmeras “novidades”, culminando com uma facilitação ao acesso à educação, o que naturalmente possibilitou ao individuo um crescimento intelectual e assim sendo exigindo por parte das autoridades públicas um tratamento condizente com a nova realidade.

Lamentavelmente, as instituições militares “esqueceram” de acompanhar tal evolução e ainda hoje, em muitos casos, alguns gestores, tratam os servidores, notadamente os Praças, tal qual tratavam no século passado, com desdém, com falta de respeito, como se estes fossem meros serviçais, seres acéfalos, não detentores de direitos, de personalidade, de hombridade e em alguns casos como se estes nem humanos fossem.

A lógica autoritária, balizada pela imposição pura e simples, não se coaduna mais com o homem do século XXI, notadamente em uma profissão que exige do profissional o respeito aos direitos humanos, a dignidade, entre outras características do Estado democrático de Direito.

Outra característica peculiar da profissão ao qual “abraçamos” diz respeito ao contato com o público. Tal contato permite ao policial uma averiguação “in loco” do desenvolvimento sócio-cultural ocorrido e neste momento, percebe o profissional quão diferente, quão evoluído encontra-se o destinatário de se trabalho, sendo que, no entanto, ele, profissional não sente em seu dia-a-dia, no seu local de trabalho, parte desta transformação e é tolhido, muitas vezes de forma autoritária que participe do processo evolutivo humano e social.

Por certo, a situação descrita acima influencia sobremaneira o viver em família, em sociedade e a vida profissional do trabalhador, ocasionando uma desvalorização enquanto cidadão detentor de direitos, e enquanto ser humano, levando sua alto estima ao nível mais baixo a que um ser humano pode chegar, visto que as reiteradas humilhações, centradas desrespeito por parte de alguns, ocasiona um desestímulo profissional e pessoal, redundando em prejuízos para o Estado e para a sociedade.

A QUESTÃO SALARIAL

Por certo esta questão é um dos grandes ocasionadores de problemas para o profissional de segurança pública. Ressalte-se que o texto tem como foco de avaliação os Praças das instituições militares, pois a outra categoria que compõe as instituições militares, não sofre com o objeto da matéria jornalística em questão, ou seja, com poucas ou nenhum exceção, o Oficiais das referidas instituições não são passíveis de nenhum dos problemas elencados acima e muito do problema em avaliação no momento, qual seja a questão salarial.

Historicamente, o salário dos profissionais de segurança pública sempre esteve aquém da necessidade real do trabalhador ou mesmo da importância da função desempenhada por este. Tal fator deve-se a completa falta de respeito e consideração por este servidor, a despeito de ser este quem arca com as conseqüências da desorganização e das ingerências das autoridades civis, notadamente àquelas em que a sociedade normalmente é excluída das decisões e não raras vezes, vítima do processo de personificação do poder, através de decisões de cunho oligárquico.

Em suma, o administrador, ainda hoje utiliza-se do aparato estatal (policiais militares), como forma de manter uma aparente “serenidade” social, uma aparente “ordem pública”, sendo que em uma análise invertida do viés de desorganização e ou suposto descontrole social, em muitos casos o próprio administrador público é o gestor e insuflador de tais desmandos, seja por incompetência ou mesmo por má fé.

Além da desvalorização salarial, capitaneada pelo administrador civil, outro fator de extrema relevância e que talvez seja um dos motivos de maior decepção do trabalhador da base das instituições militares é ver seus superiores se refestelarem com polpudos reajustes, concedidos de forma direta o indireta, solidificando uma política de discriminação salarial e exclusão interna, alicerçada em uma ideologia separatista, divisionista, dotada de pré-conceitos, inclusive de classe, haja visto que muitos de nossos gestores não se contentam apenas com a superioridade alicerçada na hierarquia funcional, necessitando também mostrar uma superioridade salarial como forma de, de fato mostrar que o trabalhador da base se sinta inferior, não só do ponto de vista hierárquico, mas também como classe social.

Em resumo, ao aceitar reajustes com diferenciação tão gritante e ainda se utilizar dos regulamentos autoritários como forma de calar aqueles que vislumbram uma condição de vida mais digna, nossos gestores (naturalmente que temos exceções) criam as condições perfeitas para o stress pessoal e profissional, além de um completo descrédito no sistema que deveria ser alicerçado por companheirismo e camaradagem.

Perdeu-se a lógica e razão, pois aqueles que deveriam zelar, nos representar e lutar por condições salariais dignas e justas para todos os integrantes das corporações, simplesmente “esqueceram” de seus subordinados hierarquicamente, defendendo apenas seus interesse, auxiliados pela aproximação natural com as autoridades civis e aproveitando-se de tal aproximação para vislumbrarem uma condição salarial apenas para si, em detrimento do conjunto.

Eis mais um motivo do auto número de profissionais se afastarem do trabalho, procurando um auxilio.

De forma um tanto quanto sintética procurou-se explicitar o conjunto de fatores que em épocas passadas já foram motivos de desestabilidade emocional de servidores da base das instituições militares e que no momento se agravam em função do abandono a que estão submetidos estes profissionais, seja abandono por parte do Estado ou mesmo por parte daqueles que em tese deveriam propiciar as condições adequadas para que estes pudessem fazer seu trabalho com a qualidade e o profissionalismo que a sociedade exige e merece.

Naturalmente que para alguns, o texto parece longo, no entanto, acaso algum estudioso queira de fato ouvir o clamor de uma massa de trabalhadores esquecida e resolva realizar uma pesquisa de forma individual, com entrevistas e depoimentos, verificando in loco a situação destes servidores, sem dúvida obteria histórias e material suficientes para escrever um livro.

Para finalizar e como forma tentar mudar esta realidade dos profissionais militares estaduais da base, cabe um pedido a todos aqueles que de fato se preocupam com a segurança pública e, por conseguinte, com a sua segurança, qual seja, auxiliem a mudar esta lógica egoísta, separatista, excludente, pois existem múltiplas formas de violência contra estes profissionais e como bem afirmou a matéria do referido jornal, bem como a matéria de uma revista de circulação nacional em 08/11/2009, NOSSOS POLICIAIS ESTÃO SOFRENDO - http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI103493-15223,00.html.

A questão a se refletir com seriedade é que as conseqüências deste sofrimento não são somente daqueles que estão sofrendo, mas sim de toda a sociedade.

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